Três razões para incluir crianças como participantes ativos na ciência

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Cláudia Silva

A visão das crianças como seres vulneráveis e dependentes, sem grande capacidade de ação ou de intervenção na sociedade, tem sido confrontada pela investigação científica, no envolvimento de crianças na  ideação de design de tecnologias digitais ou no planeamento urbano, por exemplo.

Há pelo menos duas décadas que investigadores defendem a necessidade e relevância de incluir as crianças, incluindo as abaixo de 13 anos, como co-cientistas e co-designers, considerando-as como seres ativos e pensantes em projetos de investigação, e não somente como objetos de estudo.

Vejamos algumas razões para esta inclusão ativa das crianças na ciência.

  1. Assegurar direitos da criança: A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, aprovada em 1989, introduziu os direitos de participação das crianças, além dos seus direitos de provisão e de proteção. Estes direitos de participação têm inspirado algumas iniciativas. Uma dela, a iniciativa Cidades Amigas da Criança, da UNICEF, afirma que uma cidade amiga da criança deve estar ativamente comprometida em cumprir o direito de participação aos menores de 18 anos, incluindo a participação nas suas comunidades locais como cidadãos, os seus direitos de estarem seguros e protegidos de danos,  e os seus direitos a ambientes que apoiem suas necessidades de aprender, brincar e ser social (UNICEF, 2013).

    Além disso, documentos de 2021 do Comité Europeu para os Direitos da Criança recomendam a atenção dos Estados europeus pelos seus direitos nos contextos digitais em rápida e contínua transformação.  Nota pessoal Cláudia: DAR EXEMPLO
  1. Viabilizar a inclusão das necessidades e pontos de vistas das crianças em artefactos tecnológicos: Allison Druin, uma norte-americana pioneira nesta área, defende que as crianças são especialistas na sua própria realidade. E, como tal, incluí-las como co-cientistas desmarginaliza e empodera as crianças.

    Esta inclusão é benéfica em dois sentidos: por ser educativa, e por ir ao encontro de uma responsabilidade moral de intelectuais, designers e programadores que detêm o poder de decidir sobre os interesses de terceiros, e a construção de tecnologias.

    Incluir as crianças permite que elas próprias façam escolhas sobre o futuro que desejam ter e que influenciem a criação de políticas públicas.

    Neste sentido, vários estudiosos defendem que a inclusão de criança no desenvolvimento de tecnologias não deve visar somente resultados tangíveis, como produtos.  Enfatiza-se que este tipo de metodologia deve incitar novos insights, competências de design e uma postura crítica e reflexiva em relação à tecnologia que as crianças usam no seu dia-a-dia.
  1. Enriquecer a investigação científica: Recentemente, novas ideias e novas tecnologias têm surgido cada vez mais a partir da co-criação com as crianças. Esta inclusão permite também a inclusão de encarregados de educação, numa lógica de colaboração, em que a família ocupa um papel central no desenvolvimento de soluções sociotécnicas. Neste caso, os adultos são convidados a refletir sobre suas posições de autoridade em relação às crianças, para que estas sejam posicionadas como protagonistas, e não só como sujeitos passivos, numa posição de escuta.

Saiba mais

Allison Druin, uma das investigadoras pioneiras na área de criação de tecnologias com as crianças, tem sido uma presença influente na conferência internacional Interaction Design and Children, um espaço de reflexão sobre conteúdos académicos relacionados com a inclusão participativa das crianças em investigação. Em 2022, esta conferência teve lugar em Portugal.

Sobre a Autora

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Cláudia Silva

Professora Auxiliar - IST Univ. de Lisboa. ITI-LARSyS

Tem desenvolvido investigação participativa com crianças para entender como podem contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias de cariz sócio-técnico.