Gisela Canelhas
3 de Julho, 2022
São inúmeros os vídeos disponíveis em plataformas digitais como o YouTube, dirigidos às crianças, para ensinar vocabulário, línguas estrangeiras ou matemática, entre outras áreas. Mas será que se pode mesmo aprender com vídeos educativos
Até há pouco tempo, os vídeos educativos eram vistos como recurso complementar da sala de aula ou associados somente à aprendizagem informal. Com o encerramento das escolas derivado à pandemia, a partir de 2020 ganharam autonomia e um papel de relevo também no ensino formal.
Ferramenta eficaz ou perda de tempo?
Apesar deste crescimento e uso em diferentes ambientes, a eficácia pedagógica dos vídeos educativos não está devidamente comprovada. Há estudos que sugerem que o tempo que é alocado ao consumo destes conteúdos pode ser mais bem aproveitado na execução de outras tarefas que levam a melhores resultados académicos no longo prazo.
Um estudo realizado na Austrália e na Nova Zelândia revelou que o tempo de visionamento de conteúdos em ecrãs não melhora necessariamente o desempenho académico, mesmo quando os conteúdos têm um caráter educativo. Como possíveis causas foram apontadas a falta de qualidade de muitos dos conteúdos visionados e a falta de adequação dos mesmos à idade do público-alvo.
Outros estudos demonstram a potencialidade dos vídeos educativos para a aprendizagem e para o desenvolvimento de competências cognitivas e sociais, desde que corretamente produzidos e utilizados.
Por isso, importa conhecer:
- Os fatores que determinam a eficácia pedagógica dos recursos educativos, começando pela idade recomendada para o uso deste tipo de materiais;
- As limitações dos vídeos educativos, começando pela idade apropriada para o seu uso e as estratégias que maximizam a aprendizagem através dos mesmos.
Os três anos como marco para a aprendizagem…
A idade apontada para que o visionamento de vídeos educativos se traduza em aprendizagens situa-se pelos três anos. Isto porque até essa idade as crianças não conseguem transferir os conteúdos presentes no vídeo para o mundo real, devido à falta de maturação de estruturas cognitivas e perceptuais que comprometem a correspondência entre o formato bidimensional do vídeo e o tridimensional do mundo à sua volta.
Outros dois fatores limitam essa aprendizagem até um determinado nível de desenvolvimento.
- A falta de interação dos vídeos educativos, que contrasta com as respostas contingenciais que as crianças mais novas reclamam no seu dia-a-dia, pelo que acabam por não lhes dar importância, como apontam alguns estudos.
- Uma vez que os objetos nos vídeos são representações de objetos no mundo real, o seu processamento cognitivo requer um pensamento simbólico, isto é, a compreensão de que se trata de uma representação. Ora as crianças mais pequenas não têm ainda desenvolvida esta competência, como sublinham estudos.
Uma exceção às condicionantes que limitam a aprendizagem por vídeo antes dos três anos é a video-chamada, na qual o interlocutor pode interagir socialmente com a criança, de modo síncrono. Dada a possibilidade de resposta contingencial, similar às que ocorrem no seu dia-a-dia, está demonstrado que é possível, sim, aprender neste contexto mesmo antes dos três anos de idade, principalmente no que diz respeito a conteúdos de aprendizagem por imitação, tais como vocabulário. Noutros contextos, é muito improvável que a aprendizagem ocorra.
Por estes motivos, no que diz respeito a crianças mais pequenas, recomenda-se que o tempo alocado ao visionamento de vídeos, ainda que educativos, seja dedicado a outras atividades que podem ser mais benéficas para o seu desenvolvimento, como seguirem a leitura de histórias infantis, a aprendizagem de música, atividades de exploração de movimento e de coordenação motora, atividades ao ar livre, entre outras.
Estratégias para a exploração de vídeos educativos em família
A partir dos três anos, os vídeos educativos podem constituir uma valiosa ferramenta de aprendizagem, que pode ser explorada em família com recurso a algumas estratégias.
Uma dessas estratégias é o visionamento dos vídeos com as crianças, parando-os em momentos-chave e aprofundando o seu conteúdo. Como sugestões de atividades quando se vê em conjunto, encontram-se o reforçar das perguntas presentes no vídeo, pedir para a criança identificar objetos ou para resumir momentos da narrativa. Estas estratégias revelam-se muito estimulantes, como tem sido provado em famílias com poucos recursos económicos.
Sugerimos, então, que dedique com regularidade alguns minutos a esta atividade em família, com as crianças com mais de três anos. Escolha um vídeo adequado à idade da criança, interaja com ela durante a sua visualização e descubra o potencial dos vídeos educativos para a aprendizagem.
Recursos educativos de acesso gratuito
A iniciativa Estudo em Casa, da RTP, que foi transmitida entre 2020 e 2021, tem uma plataforma dedicada ao alojamento deste tipo de recursos educativos (VERIFICAR LINK)
Sobre a Autora
Professora de educação musical doutorada em Media Digitais.
Principais interesses: conteúdos educativos digitais; criação audiovisual para crianças; tecnologia e aprendizagem; media digitais e desenvolvimento cognitivo.