Andrea Vilhena
15 de Setembro, 2022
Em 1982, muito antes da internet, a Declaração de Grünwald, da UNESCO, incentivou a promoção da educação dos meios de comunicação social nos sistemas escolares. No contexto digital, este texto mostra como têm sido pensadas as competências de educação para os media e a importância de nelas incluir a imaginação cívica.
Com base no que apontavam estudos e na sua própria experiência de investigadora no terreno junto de adolescentes, em 2010, Renée Hobbs, especialista norte-americana em Media e Educação, sistematizou um plano de ação em torno de cinco competências fundamentais de educação para os media: Acesso, análise e avaliação, criação, reflexão e ação.
Acesso | Localizar e identificar informações relevantes. |
Análise e avaliação | Examinar as mensagens e informações usando pensamento crítico. |
Criação | Criar conteúdo de forma criativa e critica, com consciência do propósito e do público. |
Reflexão | Refletir sobre as mensagens digitais e mediáticas que se cria e pensar sobre os efeitos que podem ter na vida próprio e dos outros. |
Ação | Trabalhar individual ou em colaboração para partilhar conhecimento e resolver problemas, em família, na escola, na comunidade. |
Desde então, este plano de ação, amplamente difundido, esteve na base de muitos projetos e programas de educação para os media desenvolvidos em contexto escolar e informal.
Contudo, continuando a ser necessárias essas competências, há quem argumente que já não são suficientes nos nossos dias, marcados pela intensificação da nossa relação com os meios digitais, em particular para crianças e adolescentes que não viveram outros tempos que não os digitais. Não basta ter literacia mediática, é preciso saber também como viver com os media, uns com os outros, em conjunto.
Literacias mediáticas cívicas
Paul Mihailidis, académico e educador norte-americano, argumenta que a consciência crítica dos processos mediáticos não leva necessariamente a uma ação ou envolvimento significativos. Para esse envolvimento, é preciso estar dotado de literacias mediáticas cívicas.
Estas literacias:
- Visam cultivar a intencionalidade cívica dentro das práticas da literacia mediática.
- Procuram que o pensamento crítico esteja relacionado com a ação e a reflexão.
- Propõem competências que sejam orientadas para valores e não apenas para processos.
- Assentam em cinco pilares de valores: Cuidar, consciencializar, imaginar, persistir, emancipar.
Cuidar | O cuidar para e o cuidar com estão no cerne das práticas porque unem as pessoas. |
Consciencializar | Baseia-se na pedagogia do educador brasileiro Paulo Freire. Uma consciência crítica sobre a realidade é necessária para participar em processos de mudança social. |
Imaginar | Abre a educação mediática a um público mais jovem, torna-a mais atrativa e acessível, proporciona formas criativas de participação. |
Persistir | É um ato necessário num mundo em que as tecnologias capturam cada vez mais a atenção. |
Emancipar | Permite uma prática de comunicação emancipatória que se centra na justiça social como objetivo final. |
O lugar da imaginação cívica na educação
A imaginação cívica é definida por Henry Jenkins, outro investigador norte-americano atento ao ativismo juvenil, como “a capacidade de imaginar alternativas às atuais condições sociais, políticas ou económicas”. Para Jenkins, a imaginação cívica é essencial porque se queremos intervir no mundo precisamos de imaginar como poderia ser diferente.
O ato de imaginar alternativas a problemas é particularmente importante para crianças e adolescentes, que crescem a ouvir notícias de catástrofes e de outras situações que não controlam, o que pode levar ao cansaço, desinteresse e apatia, como aponta por exemplo este artigo.
Promover ambientes de aprendizagem em que os jovens imaginam diferentes futuros – possíveis e impossíveis – é importante para criar e fortalecer comunidades, a própria agência cívica e o respeito pelos outros. Um exemplo disso é o Projeto da Imaginação Cívica, da rede de investigação da Fundação MacArthur’s Research Network e que assenta nos contributos de Henry Jenkins.
Os jovens precisam de um renovado sentimento de esperança e da perspectiva de que podem, coletivamente, reformar a nossa sociedade no sentido de um bem comum.
Referências
Henry Jenkins. 2016. By any media necessary: the new youth activism. New York University Press, New York.
Paul Mihailidis. 2019. Civic media literacies: re-imagining human connection in an age of digital abundance. Routledge, Taylor & Francis Group, New York; London.
Sobre a Autora
Investiga como as artes podem ser úteis para ensinar literacias cívicas a pais e jovens. É docente na Salzburg Academy on Media and Global Change.
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