Maria Castellvi Lloveras
25 de Setembro, 2025
Entre a vontade de visibilidade e o desejo de se protegerem, adolescentes de Espanha partilham experiências e estratégias para lidar com o que notam ser um crescente ambiente tóxico nas redes sociais. Testemunhos para alimentar partilhas e recomendações para agirmos.
“Quando era mais nova, queria ser youtuber, agora já não quero. Pensava que ia ser famosa e todas essas coisas, era o meu sonho!… Mas agora a única coisa que fazem é criticar. Todas as tiktokers que sigo receberam muito “hate”. Dantes, não criticavam tanto, mas tudo foi mudando.” (Yamina, 14 anos)
Ter presenciado campanhas de ódio para com influenciadoras e percecionar uma crescente hostilidade nas redes sociais, especialmente no TikTok, é uma opinião partilhada pelas cerca de 60 adolescentes que participaram neste estudo. Em entrevistas, identificam o TikTok como um terreno especialmente perigoso, devido ao facto de o algoritmo de recomendação fazer com que o conteúdo que publicam chegue a audiências muito vastas e desconhecidas.
Para além de recearem comentários negativos de desconhecidos, as adolescentes também revelam preocupação com possíveis críticas de pessoas conhecidas, principalmente colegas da turma:
“Preocupa-me publicar coisas pelo que os outros podem pensar de mim. Muita gente pode fazer captura de ecrã… aconteceu com uma amiga minha: alguns colegas de turma captaram uma fotografia em que ela aparecia de biquíni e começaram a partilhar.” (Alba, 14 anos)
Para estas adolescentes, as redes sociais são um território hostil onde se devem movimentar com cuidado, para proteger a sua reputação, online e offline. Este imaginário é construído a partir das suas próprias vivências, de experiências de amigas e colegas, e também de testemunharem campanhas de ódio recebidas pelas suas influenciadoras favoritas.
Sem dúvida que isso tem impacto direto na gestão dos seus perfis nas redes sociais. Fazem-no tendo em conta não só as características das próprias redes, mas também por uma continuada e atenta vigilância sobre a imagem que vão projetando.
Estratégias de autoproteção
- Limitar audiências: gerir contas secundárias e usar filtros de segmentação como os que, por exemplo, o Instagram oferece. No perfil público, publicam conteúdo altamente selecionado e cuidado; em perfis “secundários”, onde apenas aceitam pessoas dos seus círculos mais próximos, publicam imagens e vídeos mais espontâneos;
- Gerir tempos: dar preferência a conteúdo efémero, como os stories do Instagram, que desaparecem após 24 horas;
- Rever e limpar: apagar periodicamente o conteúdo já publicado, revendo os seus perfis de uma forma recorrente, para que estejam coerentes com a sua identidade.
Nas opções oferecidas pelas plataformas, como o TikTok, adolescentes contam como se apropriaram de um dos seus recursos e mudaram o seu propósito inicial. A pasta de rascunhos (Draft folder), cuja função é salvar vídeos inacabados para os terminar mais tarde, é usada por elas como um “espaço seguro”, onde podem guardar um grande número de vídeos que quase nunca acabam por publicar.
Por exemplo, Erin contou-nos ter mais de 900 vídeos armazenados na pasta de rascunhos e apenas oito publicados no seu perfil. Assim, a pasta de rascunhos do TikTok acaba por ser um espaço onde as adolescentes se podem divertir testando filtros, coreografias ou tendências sem o receio de se exporem.
Desejo de visibilidade
Embora possa parecer contraditório, essas estratégias de proteção e limitação da presença online convivem com outras práticas que procuram conseguir visibilidade. Nesse sentido, muitas adolescentes imitam técnicas típicas das influenciadoras para posicionar o seu conteúdo: usar hashtags para chamar a atenção dos outros ou do próprio algoritmo de recomendação do TikTok (por exemplo, usando hashtags genéricos como #viral, #ForYou); participar em tendências populares da plataforma; usar músicas e áudios virais.
Algumas participantes referiram como se sentiram quando algumas das suas publicações se tornaram virais no TikTok. Por exemplo, no Dia Internacional da Mulher, Elna publicou um video a dançar e a fazer lip sync, ao som de uma música que estava em alta e reproduzindo uma coreografia muito conhecida. Esse vídeo alcançou mais de 27.000 visualizações num único dia, quando ela tinha pouco mais de 250 seguidores. Então Elna experimentou sensações contraditórias:
“Estava com as minhas amigas e vi que, de repente, tinha muitas notificações, muitos gostos e novos seguidores. Primeiro fiquei super contente, mas depois… fiquei assustada! Quando percebes que já apareceste milhares de vezes no ForYou… isso dá mesmo medo!” (Elna, 14 anos)
Assim, mesmo quando a visibilidade é procurada, pode ser recebida com ambivalência: uma mistura de orgulho e alegria; uma boa dose de medo das consequências que a exposição pode trazer.
Recomendações
A partir das experiências das adolescentes que participaram neste estudo, podemos pensar em estratégias e recomendações para uma experiência digital mais segura e gratificante:
- Criar momentos de debate onde as jovens possam partilhar as suas experiências e preocupações sobre as redes sociais, evitando culpabilizar as adolescentes e incentivando a reflexão, a escuta e a validação de suas experiências;
- Chamar a atenção para a responsabilidade das plataformas digitais e para o facto de as suas características serem muitas vezes prejudiciais, já que fomentam aspetos como o anonimato, a viralização ou os discursos de ódio;
- Promover uma educação afetiva e ética sobre o respeito em ambientes digitais, abordando aspetos como o consentimento digital e as consequências de práticas de violência digital;
- Proporcionar ambientes onde jovens possam criar, explorar e expressar-se fora das lógicas algorítmicas, em oficinas em espaços de educação formal e informal.
Publicações Relacionadas
Sobre a Autora
Maria Castellvi Lloveras
Doutora em Comunicação pela Universidade Pompeu Fabra
Pesquisa sobre jovens, cultura digital e cultura popular, e dirige o Festival Reteena, sobre cultura audiovisual juvenil.
Ver Publicações →