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Cristina Ponte e Teresa Sofia Castro
20 de Fevereiro, 2025
Presente em mais de 30 países, entre os quais Portugal, a rede europeia EU Kids Online sustenta que as proibições são problemáticas, aponta alternativas e responsabilidades partilhadas e opõe conhecimento a narrativas simplistas.
A investigação independente da rede EU Kids Online procura aumentar o conhecimento sobre oportunidades, riscos e segurança online das crianças europeias e os seus resultados têm informado políticas públicas nacionais, europeias e internacionais.
Com vinte anos, a rede orienta-se pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e o Comentário Geral n.º 25 sobre os direitos das crianças no ambiente digital.
Proibições são problemáticas
Nos últimos tempos têm sido reclamadas proibições como meio para garantir a segurança das crianças no mundo digital. Contudo, a investigação aponta que proibições definitivas podem piorar a situação em vez de a resolver.
Restringir o acesso das crianças às plataformas digitais pode fazer ignorar as causas básicas dos riscos online e ter consequências negativas indesejadas.
Há mais de duas décadas que o mundo digital é parte integrante de crianças e adolescentes. Redes sociais, telemóveis e outras tecnologias digitais oferecem oportunidades para aprender, conectar-se e expressar-se. Estudos mostram que estas plataformas permitem que adquiram competências essenciais, interajam com colegas e acedam a informações vitais.
Embora os espaços digitais apresentem riscos, proibir totalmente o seu acesso não melhora necessariamente a segurança.
Alternativas às proibições
Importa ter em conta as idades, necessidades e circunstâncias. O seu direito a participar e a beneficiar do mundo digital deve ser equilibrado com medidas de proteção eficazes, em vez de ser eliminado por restrições generalizadas.
Como participantes ativos e detentores de direitos, crianças e adolescentes procuram proteção e inclusão no meio digital, para que se possam envolver e expressar em segurança.
Quando a sociedade restringe liberdades, os objetivos de restrições devem ser claramente expressos, os meios devem ser proporcionais e as medidas devem ser eficazes, transparentes e baseadas em evidências.
Implementar proibições de utilização de ecrã, smartphones ou redes sociais sem consulta viola o Artigo 12º da Convenção dos Direitos da Criança, que reconhece o direito a serem ouvidas em decisões que as afetam. Embora crianças mais novas ou grupos vulneráveis possam necessitar de proteções personalizadas, restrições amplas e universais correm o risco de prejudicar a autonomia e a capacidade de ação de todas.
Em vez de recorrer a proibições ou esperar por soluções universais, a rede EU Kids Online reclama que decisores políticos invistam em quadros regulamentares fortes – e fortemente aplicados. Que exijam que as plataformas digitais mantenham elevados padrões de segurança, como a segurança pelo design, da Austrália, ou normas adequadas à idade, como na Europa.
Responsabilidades partilhadas
Governos, reguladores e indústria devem assumir responsabilidades pela segurança online, em vez de colocar o ónus apenas nas crianças, pais ou cuidadores.
Plataformas digitais e reguladores devem antecipar e abordar necessidades e direitos das crianças de forma justa e inclusiva, em vez de dependerem apenas dos pais e dos professores para enfrentar os desafios da segurança. A regulamentação é vital para que as empresas tecnológicas ajam de forma responsável.
Iniciativas educativas deverão complementar os esforços de segurança digital:
- Programas de literacia digital para crianças, pais, educadores e profissionais que apoiam os jovens.
- Orientação para decisores sobre como elaborar intervenções eficazes e sustentadas.
- Aplicação proativa de normas de segurança, garantindo que as plataformas cumprem os requisitos de design adequados para crianças.
Evidências científicas vs. narrativas simplistas
As decisões não se devem basear em mitos, ansiedades públicas ou exibicionismo político. Preocupações sobre redes sociais e saúde mental são válidas, mas estudos revelam inconsistências: alguns encontram benefícios, outros observam riscos, muitos não evidenciam efeitos significativos.
Dito isto, alguns adolescentes – em especial os já vulneráveis a problemas de saúde mental – podem sofrer efeitos negativos do uso excessivo das redes sociais ou dos jogos.
Esta complexidade realça a necessidade de intervenções direcionadas em vez de amplas proibições, e de investigação rigorosa e diferenciada em vez de narrativas simplistas que podem não abordar questões subjacentes como isolamento social, cyberbullying ou manipulação algorítmica. Por isso, as proibições não são resposta.
Os governos devem investir em intervenções com base em evidências, específicas e desenvolvidas ouvindo as crianças (em vez de lhes serem impostas), e avaliadas quanto à sua eficácia por investigação rigorosa e diferenciada.
Respeitar os direitos das crianças no mundo digital
A UNICEF sublinha que os direitos das crianças devem ser plenamente realizados em ambientes digitais. A ONU reconheceu-o no seu Pacto Digital Global. A estratégia da União Europeia considera esses direitos, como muitos outros países.
Para proteger de modo eficaz as crianças na era digital, são necessárias estratégias coordenadas e urgentes. Proibições generalizadas ignoram as vozes das crianças, prejudicam os seus direitos e não proporcionam a proteção de que necessitam quando acedem à Internet.
Em vez disso, soluções bem regulamentadas e baseadas em evidências que equilibram a proteção e a inclusão oferecem uma via mais sustentável. Uma abordagem com base nos direitos e na segurança pode criar um mundo digital onde as crianças avancem, em vez de serem excluídas.
Conclusão: exclusão não é sinónimo de proteção
É possível uma internet mais segura, sem comprometer os direitos das crianças. Em vez de proibir o acesso aos espaços digitais, deveríamos:
- Reforçar regulamentações que garantam que as plataformas criam ambientes online mais seguros.
- Promover literacia digital junto das crianças, pais e educadores.
- Incentivar políticas baseadas em evidências em vez de proibições generalizadas.
- Respeitar os direitos das crianças consultando-as sobre decisões que afetam a sua participação online.
Iniciativas educativas deverão complementar os esforços de segurança digital com:
- Programas de literacia digital para crianças, pais, educadores e profissionais que apoiam os jovens.
- Orientações para intervenções eficazes e sustentadas de decisores.
- Aplicação proativa de normas de segurança, garantindo que as plataformas cumprem os requisitos de design adequados para crianças.
- Políticas baseada em evidências: expandir e aprofundar o conhecimento científico, de decisores políticos e do público sobre a vida digital das crianças; promover investigação relevante e de qualidade, identificando as suas fraquezas e lacunas.
Para tal, a rede EU Kids Online assegura:
- Abertura: divulgamos as nossas conclusões científicas de forma honesta, em canais de acesso aberto e/ou revistos por pares sempre que possível.
- Independência e transparência: Interagimos com as partes interessadas, incluindo governos, decisores políticos, indústria e sociedade civil, mantendo uma abordagem independente e evitando conflitos de interesses.
- Integridade: conduzimos todas as pesquisas e colaborações com integridade e somos transparentes sobre as fontes de financiamento.
Texto adaptado do Manifesto Protecting, Not Excluding: Why Banning Children from Social Media Undermines Their Rights.
Para mais informação, consulte www.eukidsonline.net
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Tem investigado a relação das crianças de diferentes contextos e a mediação das suas famílias com as tecnologias digitais: usos e competências, como lidam com riscos, práticas de socialização e mediação.
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