O que pensam os jovens sobre telemóveis nas escolas

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Eduarda Ferreira

Existe na opinião pública uma opinião generalizada de que os jovens não têm uma atitude crítica relativamente aos telemóveis na escola, e que não querem limites à sua utilização. No entanto, respostas dos próprios jovens apontam para uma perceção adequada ao contexto, com diferenças consoante os espaços escolares, nomeadamente intervalos, e salas de aula.

No final de janeiro organizei uma sessão com jovens do 12º ano que estão a preparar-se para participar no Parlamento dos Jovens, que este ano tem como tema Novas tecnologias: oportunidades e desafios para os jovens. As ideias apresentadas e discutidas pelas/os jovens foram muito interessantes e fiquei com a clara impressão de que temos razões para acreditar nas novas gerações. 

No meio de vários temas atuais e muito interessantes, como a inteligência artificial ou as fake news, o tema principal do debate foi a utilização dos telemóveis nas escolas. Este é um tema que ocupa e preocupa as/os jovens. E para além de estudos e relatórios que existem sobre este tema (Rahali, Kidron & Livingstone, 2024), creio ser importante ouvir as suas opiniões.

No agrupamento de escolas Sebastião da Gama, em Setúbal, fizemos um questionário a alunos/as do 3º ciclo e secundário para envolver jovens no debate sobre a melhor forma de utilizar os telemóveis em contexto escolar. Obtivemos 706 respostas, igualmente distribuídas por raparigas e rapazes, com idades entre os 11 e os 19 anos: 14% entre 11-13 anos, 56% entre os 14-16 anos, e 30% entre 17-19 anos. Por ciclos de estudo, 39% eram do 3º ciclo e 61% do ensino secundário.

Usos em diferentes espaços

Quando inquiridos sobre a utilização de telemóveis nos intervalos, a grande maioria (74%) acha que devem ser utilizados livremente. Os 26% que responderam que devem ser utilizados com regras, identificaram atividades que deviam ser proibidas ou controladas: gravar vídeos (45%) e tirar fotos (17%).

Relativamente às salas de aulas as/os jovens manifestaram uma opinião diferente: só 14% consideraram que devem ser utilizados livremente; 80% acham que devem ser utilizados para fins estritamente pedagógicos e com autorização das/os docentes; e os restantes 6% são da opinião de que devem ser proibidos dentro das salas de aula.

Estes resultados evidenciam a consciência dos/as jovens sobre a importância de existirem regras para a utilização de telemóveis nas salas de aula.

Nas salas de aula, para quê?

As suas respostas sobre como é que os telemóveis podem ser utilizados para fins pedagógicos na sala de aula mostram que as/os jovens conhecem o potencial educativo dos telemóveis nesse contexto:

  • Pesquisa e trabalhos académicos
    • Realizar pesquisas online relacionadas ao conteúdo da aula ou aos temas discutidos
    • Aceder a informações úteis e relevantes para atividades e tarefas escolares
    • Utilizar como suporte em trabalhos de grupo ou individuais, especialmente em casos de ausência de outros equipamentos tecnológicos
  • Dinamização da aula
    • Realizar questionários interativos, quizzes e jogos pedagógicos como o Kahoot
    • Assistir a vídeos educativos ou interativos relacionados com os conteúdos curriculares
    • Realizar atividades que tornem a aprendizagem mais lúdica e dinâmica
  • Utilização prática
    • Uso de aplicativos específicos, como calculadoras, tradutores ou ferramentas de criação (e.g., Canva, PowerPoint)
    • Acesso a manuais digitais e outros recursos educacionais
    • Substituição de materiais físicos, como cadernos e livros, por recursos digitais

E de que modos, nas escolas?

As ideias e sugestões sobre a utilização de telemóveis nas escolas refletem tanto os benefícios quanto os desafios associados ao uso de telemóveis no ambiente escolar.

As principais ideias e sugestões partilhadas foram:

  • Propostas a incluir no regulamento da escola
    • Restringir telemóveis em salas de aula, exceto para atividades pedagógicas
    • Diferenciar as regras em função da idade, dar mais liberdade a alunas/os com mais idade e controlar os mais jovens
  • Desafios e preocupações
    • Reconhecimento de que muitas/os jovens são dependentes, o que prejudica o seu desempenho académico
    • Preocupação com gravações, fotos e outras atividades que podem violar a privacidade de colegas e docentes
    • Necessidade de ensinar o uso responsável e ético dos telemóveis
  • Equilíbrio no uso dos telemóveis
    • Importância de reduzir o tempo gasto nos telemóveis para promover interações sociais e evitar arrependimentos futuros por tempo perdido
    • Equilibrar os momentos offline e online
  • Sugestões de melhorias
    • Criar espaços alternativos, áreas de convivência para promover atividades offline e interação social
    • Investir em programas para equilibrar o uso de tecnologia com outras atividades offline
    • Incentivar a participação ativa dos alunos nas aulas com dinâmicas que incentivem a aprendizagem e a criatividade

Considerar os pontos de vista de jovens

Com base nesses resultados, podemos afirmar que as/os jovens têm uma visão equilibrada do uso dos telemóveis na escola, reconhecendo tanto as suas potencialidades quanto os riscos envolvidos. Além disso, sugerem medidas concretas que poderiam contribuir para uma experiência escolar mais enriquecedora, integrando a tecnologia móvel digital às práticas pedagógicas de forma não disruptiva.

Por isso, as vozes das/os jovens devem ser tidas em consideração na conceção das políticas relativas aos smartphones nas escolas antes da sua implementação. Essas políticas tendem a ser mais eficazes quando os pontos de vista de todos os intervenientes, incluindo as/os jovens, são ouvidos, e as decisões são formuladas com a sua participação, em vez de serem impostas de forma unilateral.

Referência:

Rahali, M., Kidron, B., and Livingstone, S. (2024). Smartphone policies in schools: What does the evidence say? Digital Futures for Children centre, LSE and 5Rights Foundation.

Sobre a Autora

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Eduarda Ferreira

Psicóloga Educacional - CICS.NOVA.

Interesses de investigação: web geoespacial, TIC na educação, inclusão digital, sexualidades e igualdade de género.